sábado, 18 de dezembro de 2010

Auto-mutilação e falta de diálogo


Imagens como essa falam por si só. Religião sendo levada a seus extremos por um garoto que pouco deve conhecer sobre racionalidade e que foi, com efeito, provavelmente alienado por uma crença fundamentalista e pouco racional. Com essa imagem e esse pequeno texto gostaria de colocar em pauta um assunto por vezes pouco discutido no Brasil, qual seja, a irracionalidade e os perigos gerados pelas religiões.

O debate sobre a credibilidade da religião no país é ainda como a presença daquele grande elefante na sala, um incômodo como foi as discussões sobre sexo nas décadas passadas. Mas por que tudo isso? Por qual motivo discutimos política, falamos sobre futebol e debatemos a respeito de gostos musicais, mas, quando o assunto é crenças religiosas o campo torna-se mais arriscado e a discussão murcha? Qual a diferença em dizer "prefiro os filmes de Kubrick aos de Scorcese e detesto os de Jodorowsky, que são experimentais demais para meu humilde gosto cinematográfico" e perguntar "por que você acredita em Jeová e não crê em Thor, Odin, Osiris, Zeus? Por quais motivos é conveniente crer em entes tão improváveis como deuses?". A diferença, talvez, resida no fato de que discutir religião tornou-se um tabú tão forte que, caso alguém o faça, essa pessoa estará, automaticamente, proferindo uma ofensa à crença do outro e será vista como alguém desrespeitoso e mal-educado. Contudo, esse relativismo é capenga demais. Afinal, qualquer um pode sentir-se ofendido ao ter uma música que gosta, ou então, um filme muito querido criticado. A religião deve ser debatida de forma racional, como se fosse um assunto qualquer e não como um conteúdo restrito, blindado a críticas. Partindo desse pressuposto, alguns aspectos das doutrinas religiosas, como o extremismo da auto-mutilação, da flagelação e das diversas mortes causadas em nome de crenças fanáticas devem estar em pauta, caso queiramos construir uma sociedade mais humanista.

Pergunto-me até que ponto essas práticas extremadas são sadias ao corpo e à mente dos praticantes. É claro que é direito inviolável do homem a liberdade de poder fazer o que bem entender consigo mesmo desde que essas atitudes não impliquem em danos a terceiros. Caso a mutilação seja um desejo individual, então, a liberdade de ir e vir assegura ao praticante o direito à auto-flagelação. No entanto, apesar de a liberdade ser inalienável, os adeptos de rituais religiosos extremos, majoritariamente, estão imersos em uma cultura que prima pouco pelo racionalismo e que são, freqüentemente, fundamentadas em práticas religiosas antigas. É aí que a situação torna-se mais complicada. Os que cresceram em locais nos quais a auto-mutilação corporal é algo comum, certamente tiveram pouco contado com o secularismo, o racionalismo e foram moldados, involuntariamente, de acordo com os costumes locais. O ponto que ressalto aqui é a infeliz falta de opções dos moradores dessas comunidades praticantes de extremismos religiosos, os quais, talvez, caso fossem menos influenciados pelos valores da comunidade, não seriam favoráveis à auto-imolação. Uma pessoa ciente das implicações de seus comportamentos e atitudes é bastante diferente de um indivíduo ignorante das práticas diferentes das suas e inocente quanto às conseqüências de suas atividades culturais.

A discussão sobre religião torna-se, então, muito conviniente. Seja com o objetivo de informar aqueles que desconhecem os preceitos distintos de suas culturas, seja com o intuito de promover o humanismo e o secularismo; os debates religiosos devem sair do obscurantismo e passar ao casual, como é feito nas conversas a respeito de futebol, música e cinema. Ademais, a criticidade é fundamental caso objetivemos o desenvolvimento de uma sociedade menos irracional, menos marcada pelo fundamentalismo religioso e por práticas extremadas como a auto-mutilação.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Rio, drogas, Tropa de Elite e Olimpíadas


Depois de quase um mês sem publicar nada, escrevo hoje um pouco sobre a violência no Rio de Janeiro, o tráfico de drogas, Tropa de Elite e a respeito das Olimpíadas de 2016. Comecemos com uma pequena análise do cérebro humano e a tremenda vulnerabilidade que esse órgão de 1,4Kg tem, apesar dos milhões de anos de evolução, a certas substâncias entorpecentes. A realidade bioquímica a que nosso encéfalo está exposto é complexa, porém, grosseiramente, é possível dizer que tudo o que sentimos, seja dor, seja ansiedade ou prazer; está diretamente condicionado aos diversos neurotransmissores a que nosso córtex cerebral é submetido. Serotonina, dopamina, noradrenalina são apenas alguns dos muitos nomes de substâncias capazes de conduzir o impulso nervoso de um neurônio ao outro e, indiretamente, comandar nosso humor, nossos desejos, nossas angústias. Drogas psicoativas podem ser estimulantes como a cocaína, que levam o usuário a estados de euforia ou então alucinógenas como o LSD, que atua desequilibrando o balanço dos neurotransmissores, destruindo o equilíbrio criado por experiências pessoais e reativando lembranças já esquecidas, muitas das quais seriam traumáticas demais para se ter qualquer recordação. Em síntese, são substâncias que instauram o caos em uma peça de ballet hormonal, cuidadosamente planejada com base em anos de vivência.

Agora, depois dessa análise simples a respeito da vulnerabilidade do cérebro humano quanto às drogas, as atitudes proibitivas do Estado no que tange os narcóticos seriam, com efeito, justificáveis sob o ponto de vista biológico. Contudo, creio que analisar os fatos sob a ótica biológica é ser simplista demais. Existem questões sociais, civis e de ordem econômica que inclinam-me quanto a ser favóravel à legalização das drogas e que, mesmo sabendo de nossas fraquezas bioquímicas, fazem-me contestar afirmações contrárias a insticionalização do comércio de entorpecentes.

A premissa maior de que parto é a de que deve haver limites para a interferência do Estado na vida das pessoas. O que digo é que é irracional demais a existência de um contrato social no qual o Governo arbitra sobre o que um cidadão pode ou não ingerir e que, a liberdade de ir e vir e de se dizer o que pensa devem ser prerrogativas invioláveis. No mais, distante dessa convicção filosófica, há também questões sociais e econômicas que devem ser pensadas.

O tráfico de drogas é, como o comércio de qualquer substância ilegal, altamente rentável. Os gastos exorbitantes do Estado para combater o tráfico, como é feito hoje no Rio, não só serve para elevar o preço da droga e gerar mais dividendos para os traficantes, mas também funciona como alimento para a milicia corrupta, brilhantemente retratada em Tropa de Elite 2. Foi estimado, por um estudo acadêmico citado na Folha que a indústria da droga empregue 16 mil pessoas na cidade do Rio de Janeiro (mais do que a Petrobras) e movimente R$ 633 milhões anuais (mais do que o setor têxtil do estado). Assim, com lucros tão vultuosos, não é de se espantar não só o número de jovens que dão suas vidas pelo tráfico, em busca de uma fonte de renda fácil, como também a tentativa de nossas "empenhadas" polícias de abocanhar um pedaço desse mercado.

A legalização das drogas seria, nesse caso, uma forma não de acabar com todo tráfico (atitude praticamente impossível), mas de minar e reduzir os dividendos gerados pela venda de entorpecentes. De mais a mais, haveria também queda do número de policiais corruptos e a redução dos gastos estatais com repressão. Parte dos tributos arrecadados com a venda dos narcóticos (uma empresa estatal, uma Narcobrás, teria que ser criada para administrar o comércio), assim, poderia ser destinada ao auxílio de dependentes químicos que buscam reabilitação e o elevado contingente de viciados passaria de criminosos para doentes, agora tratados como problema de saúde pública.

Outro empecilho criado pela criminalização das drogas é a violência que assola os morros e que vitima pessoas completamente alheias ao tráfico. O cenário dantesco exposto pela mídia nos últimos dias serve como reflexo claro da violência extremada que a polícia é capaz de cometer, em nome da ordem e do zelo pela segurança nacional. O que assistimos recentemente foi um verdadeiro "Tropa de Elite 3", uma invasão do morro extremamente desumana, na qual os criminosos foram ora massacrados, ora executados. Não defendo traficante e não sou favorável às práticas dos comandantes dos morros, mas ouso dizer que o que as UPP fizeram foi pura carnificina. Independentemente de ser bandido ou não, ser humano nenhum merece morrer de costas e desarmado. O que o BOPE fez na favela não foi nem aplicação de pena de morte, foi execução pura e simples, sem direito a julgamento algum, como se o ser humano fosse nada mais que um animal a ser abatido. Várias pessoas estão no tráfico não por escolha, mas por falta de opção e por descaso do Estado, que além de oferecer poucas oportunidades para os moradores dos morros, os oprime de forma violenta, invade e destrói a casa dos alheios ao tráfico.

O que vejo nisso tudo é a vontade desesperada do governo fluminense em mostrar serviço e preparar o estado para receber a copa e, futuramente, as Olimpíadas. Questiono-me se isso tudo surtirá efeito e se, em 2016, a cidade do Rio tornará-se, realmente, maravilhosa. Pergunto-me também até quando os problemas sociais evidentes que assolam os morros serão tratados com descaso pelo Estado e até quando obras de infraestrutura serão postergadas. Há um dilema, uma enorme incerteza quanto ao preparo do Brasil para os eventos internacionais futuros.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Arquétipo artificial

Com o advento da cirurgia plástica e o barateamento desse processo estético, tornou-se lugar-comum, na sociedade contemporânea, o hábito de moldar o corpo humano. Desde procedimentos simples como o branqueamento dos dentes, até práticas mais elaboradas e ortodoxas como a remoção de costelas para o afinamento dos quadris, as pessoas almejam obterem um fenótipo diferente dos seus, uma fenocópia que adeque-se aos padrões de beleza vigentes. Contudo, é frequente também o descaso ou a ignorância dos pacientes que desejam mudar seus corpos, pois são, majoritariamente, indivíduos míopes quanto às complicações que intervenções cirúrgicas podem trazer não só a sua condição física, mas também a sua auto-estima.

Transtornos como anorexia e bulimia, por exemplo, motivam pessoas de peso adequado a realizarem procedimentos cirúrgicos invasivos, como operações para redução de estômago, sem qualquer motivo aparente. Ademais, soma-se ao desespero do paciente anoréxico por fazer uma cirurgia desse porte, o espírito capitalista e inconsequente de alguns médicos, que aprovam, não poucas vezes, a atitude de garotas que sofrem de transtornos alimentares, enebriadas por seu quadro clínico. Cirurgias, por serem atividades delicadas que, frequentemente demandam que seja aplicada anestesia geral, não devem ser efetuadas ao bel prazer do paciente, mas devem sim ser feitas em último caso, quando não houver mais opções ao tratamento da doença, como é o caso de angioplastias, cateterismos, colocações de marca-passo, etc.

Amantes de plásticas, nesse caso, por contrariarem a literatura médica e arriscarem-se a cirurgias complicadas apenas por vaidade, parecem desprovidos de bom-senso. Não é sabido arriscar a própria vida por tendências de modas efêmeras, que não duram mais que uma geração e que podem, fatalmente, gerar consequências nefastas não só para o corpo, mas também para a auto-estima dos pacientes. Afinal, quem é que nunca soube de casos de cirurgiões plásticos, dotados de pouco talento, que deixaram cicatrizes irreparáveis no corpo de adolescentes ou até mesmo, por descuido, as mataram, como foi o caso do Dr. Hekel, médico desta cidade de Uberaba. Ademais, é conhecido como as tendências estéticas são mutáveis e como variaram durante as várias eras da existência humana; haja visto o padrão de beleza clássico, por exemplo, no qual mulheres obesas eram sinônimo de idolatria, em contraste com o arquétipo magro da mulher contemporânea.

Por fim, é fato que a cirúrgia plástica e a preocupação estética pessoal, se vistas sob uma ótica ponderada e sadia, são construtivas ao homem. Seja com a reconstrução facial de acidentados para posteriormente reinserí-los na sociedade, seja com a pesquisa dos genes responsáveis pelo envelhecimento corporal humano, a medicina avança no sentido de proporcionar conforto e longevidade àqueles que almejam uma qualidade de vida melhor. A ciência, assim, apesar dos contra-tempos gerados pelo mau uso da cirúrgia plástica e pelos ditames da moda contemporânea, é benéfica para os que buscam o bem-estar físico e mental.

Na sociedade atual, portanto, as pessoas são, não raramente, tão inocentes quanto aos riscos em potencial proporcionado pelas cirúrgias plásticas e cegas quanto à efemeridade da moda a ponto de submeterem-se a processos cirúrgicos, por vezes invasivos, com o intuito de adequarem seus atributos físicos aos ditames efêmeros vigentes. Soma-se a isso os problemas acarretados por operações mal-sucedidas, que podem estigmatizar fisico-psicologicamente esses pacientes aventureiros, que buscam, invariavalmente, formas de inserirem-se na sociedade moldada pela moda.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Peleguismo educacional


O ENEM desse último fim de semana têm causado um tremendo reboliço. Seja com os problemas das provas amarelas, seja com a inversão das disciplinas no gabarito e o despreparo dos fiscais, muitas vezes inocentes quanto às regras do concurso, o Exame Nacional do Ensino Médio, novamente, mostrou-se um fiasco. Apesar de Fernando Haddad insistir em manter o último exame em voga, o ministro da educação parece míope quanto aos parcos atributos da educação brasileira e insistente no que tange um modelo de prova pouco promissor aqui, dado que o ensino brasileiro é ainda precoce demais para aportar propostas tão ambiciosas quanto as do novo Enem. Não foi sagaz mirarmos em países mais desenvolvidos que o nosso, dotados de níveis educacionais muito superiores e tentarmos clonar modelos de exame que não condizem ainda com o perfil do contingente discente brasileiro. Assim, ouso afirmar que, caso não façamos uma reforma drástica na educação, principalmente na base do ensino, não teremos maturidade suficiente para fazermos um ENEM digno de louvor, um exame seletivo que prime, de fato, pelo entendimento do conteúdo em detrimento da memorização.

Como estudante a algum tempo, pergunto-me se isso tudo vai mudar. Indago-me se meus filhos e netos vão ter ainda que passar pelo que passo, se vão ser lecionados por professores mecânicos, que conhecem, na maioria das vezes, somente suas disciplinas e que têm uma visão tão estreita do mundo ao ponto de tratarem as demais matérias como menos importantes; um conceito obtuso, haja visto que, majoritariamente, esses docentes desconhecem os campos do ensino distintos dos seus. Questiono-me se meus descententes vão ter que aprofundar tanto em trigonometria caso almejem uma carreira em biomédicas, se terão de estudar ciências sem saber ao certo quais são os princípios do método científico, ou então serão obrigados a absorver o conhecimento sobre evolução sem, de fato, compreender a beleza e a sutileza do processo evolutivo. Sinceramente, preocupo-me com a imutabilidade do ensino brasileiro e com número de colegas não-leitores que tenho, desprovidos de curiosidade e de sede pelo conhecimento e penso ainda que isso tudo seja talvez reflexo da educação que tivemos, deficitária em diversos aspectos.

Afirmo que tive poucos professores inspiradores, capazes de transformar conhecimento em poesia e que fui ensinado, principalmente, por pessoas maquinistas, com uma visão restrita da inter-relação entre as disciplinas básicas. Conheci poucos docentes que passaram documentários em sala de aula, que promoveram bons debates posteriormente sobre o filme e que foram capazes de citar fontes variadas para os curiosos pesquisarem e extraírem mais conhecimento sobre o assunto. Pelo contrário, foi lugar comum em minha vida estudantil o mesmo ambiente escolar enfadonho, sempre marcado pelas aulas tradicionais com o professor lecionando no quadro negro e os estudantes, bovinamente, fazendo suas anotações e fingindo que estão aprendendo.

Não sou pedagogo para dizer qual a melhor forma de reformar nosso ensino, mas digo por experiência própria que uma reforma deve ser feita urgentemente, uma reformulação principalmente no que tange a formação do professorado. Ademais, parece que tornar-se docente no Brasil está fácil demais, principalmente caso o dotado de licenciatura deseje trabalhar na rede públia, cujo crivo é bem menos seletivo que o da rede privada. Talvez uma melhor remuneração dos docentes resolva parte do problema, pois com o aumento salarial é possível haver maior oferta no mercado de trabalho e, consequentemente, mais opções para os empregadores. Contudo, creio que faz-se necessário também a melhor formação dos que desejam tornarem-se professores e maior incentivo à leitura por parte do Governo nas escolas não só públicas, mas também nos colégios privados. Seria racional que o Estado realizasse medidas capazes de reduzir o preço do livro impresso.

Em síntese, para que o ENEM seja administrado de forma racional e que o exame seja vantajoso, é primordial, primeiramente, uma reforma no ensino brasileiro. Não adianta desejarmos um modelo de prova que privilegie o entendimento e abomine a memorização se nosso ensino básico ainda prima pela alienação. Uma mudança nas diretrizes dos parâmetros curriculares das escolas em conjunto com a melhor remuneração e qualificação do professorado talvez seja uma das maneiras de se solucionar, parcialmente, o problema.

domingo, 31 de outubro de 2010

Fatos e inverdades


Fim de eleições, momento oportuno, portanto, para discutir um assunto deveras natural: mentiras. Propagar inverdades não é uma característica inerentemente humana, pelo contrário, ao observar-se a natureza, torna-se trivial a citação de exemplos que ilustram o quanto a Evolução favoreceu organismos mentirosos. A mentira está em toda parte: vírus enganam o sistema imunológico de seus hospedeiros, plantas dissimulam para livrarem-se de seus predadores, animais blefam para conseguir alimento. Mentir está praticamente inscrito no DNA.

Apesar de práticas inverossímeis ser lugar-comum no mundo natural, é o homem, artista maior, o capacitado de pronunciar maior número de inverdades para favorecer-se em situações diversas. Alguns estudos sugerem que bebês de seis meses já são capazes de simular choro para atrair a atenção de seus pais e que, em uma mera conversa de dez minutos entre adultos, são pronunciadas não menos que três mentiras por parte de cada um inserido no diálogo. Mas por que fazemos isso? Por que temos tamanha predisposição em não dizer a verdade?

Das pintas do leopardo à camuflagem do camaleão, a natureza rescende a engodo. É evolutivamente vantajoso faltar com o que é factual. Seja com mentirinhas inofensivas, como elogiar a comida de uma anfitriã, seja com práticas mais ardilosas como mentir por auto-promoção, falsificar os fatos proporciona ao homem vantagens psicológicas para lidar consigo mesmo. O bom e velho autoengano é, nesse caso, uma ferramenta poderosa para o ser humano continuar com seu cotidiano, serve como acalento para suas desilusões amorosas, para suas crenças religiosas, para seus momentos de desespero e de perdas materiais. É mais fácil mentir que encarar os fatos.

Estamos sedentos para crer em uma vida após a morte, em um consolo para a efemeridade de nossa existência, em um significado maior para nossa estada na Terra e, frequentemente, estamos dispostos a apelar ao sobrenatural para explicar nossos porquês existenciais. O autoengano, contudo, apesar de faltar, comumente, com a verdade, foi fundamental para nossa sobrevivência. Cientistas estudiosos de casos depressivos, por exemplo, chegaram a conclusão de que pessoas que fazem uma avialiação realista demais de si mesmas, são mais propensas a manifestarem quadros de depressão. Além disso, evolutivamente, nossos cérebros estão muito propensos a aceitar como verdade quaisquer declarações que cheguem até nós e, apesar de, na maioria das vezes elas serem mesmo verdadeiras, seria muito custoso para nossa espécie duvidar de tudo que ouvimos. Psiquiatras classificam como paranóicos indivíduos que duvidam até de sua própria sombra.

A mentira é, portanto, um costume comum não só entre nós, ditos racionais, mas também no mundo natural como um todo. Nossas inverdades, apesar de mais ardilosas que a dos demais organismos, não nos torna distintos dos outros animais, das plantas, dos protozoários, das bactérias, dos vírus, mas ilusta nossa insegurança quanto a assuntos desconhecidos e servem como ferramentas para nosso consolo.

domingo, 17 de outubro de 2010

Por que voto em Dilma Rousseff


A primeira razão que me faz votar na canditada do PT é o fato de não ser simpático ao PSDB. Seja com FHC e seus programas de privatizações, seja com José Serra e sua não-discussão a respeito da tributação regressiva, ambos tucanos primam por um governo com propostas de caráter elitista, que negam a realidade brasileira. O PT de Lula, ao contrário, mostra o quanto a sigla dos trabalhadores é mais madura e enxerga os empecilhos de nosso país. Afinal, foram 21 milhões de brasileiros que deixaram a miséria e outros 32 milhões que ascenderam a classe média, números pouco menores que a somatória da torcida do Flamengo e do Corinthians. Só para não parecer cabeça-de-planilha, é bom ressaltar que isso representa uma queda de quase metade da pobreza no Brasil. Alguns podem estar se perguntando "mas não seria melhor se a miséria tivesse sido erradicada?". Claro que seria, mas o problema é que 8 anos é muito pouco tempo para solucionar um problema que aflinge o país há séculos. Assim, seja durante o perído colonial, no qual a sangria do país era feita por Portugal por meio do Pacto Colonial, seja durante a Repúblia Oligárquica, quando a concentração fundiária brasileira foi consolidada, a desigualdade social foi construída muito cedo em nosso país e não é possível, em um curto governo, que esses empecilhos seculares sejam resolvidos. Além disso, ouso afirmar que um voto a favor de um candidato tucano serve como apoio à desigualdade da destribuição de renda, como suporte a tributação relativa em menor grau para os mais ricos e o aumento da massa de miseráveis que ainda assola o Brasil.


Algumas pessoas negam os fatos ao chamarem o governo Lula de assistencialista e populista. Caso assim seja, o assistencialismo torna-se o primado de qualquer governo europeu, que por excelência, tem uma política de Estado mínimo capacitada de garantir educação para todos, de assegurar um programa de saúde efetivamente qualificado, de oferecer moradia para os menos capacitados, etc. É complicado apoiar os governos europeus, que regem seus países por meio da melhoria da qualidade de vida dos menos favorecidos, e taxar o governo petista como assistencialista, com uma política paternalista demagógica. Ademais, é conveniente também ressaltar que o conceito de populismo pode ser pouco aplicado ao Brasil de hoje. Governos populistas, como foram os de Vargas, Perón e Cárdenas relizaram políticas nacionalistas de substituição de importações, estatização de atividades econômicas, imposição de restrições ao capital estrangeiro e eram caracterizados por um culto a personalidade do presidente. Lula, contudo, apesar de ter um índice de aprovação governamental que beira os 80%, não freou o capital internacional, não estabeleceu um vínculo emocional e não-racional com o povo (as estatísticas de desenvolvimento provam bem isso) e não promoveu passeatas, desfiles nos quais cartazes gigantescos com sua foto seriam símbolos de idolatria pela classe operária. Chamar o governo petista de populista, portanto, é negar a definição histórica de populismo político.

Agora que falei tanto de Lula e praticamente nada de Dilma, alguns devem estar se perguntando: "isso tudo o que você disse foi o governo do atual presidente, como uma candidata com um histórico político tão pobre, sem carisma e expressivdade alguma, pode garantir o desenvolvimento de nosso país?". Combato esse argumento lembrando que é inocente demais afirmar que, em nosso país, a figura do presidente é preponderante e de suma importância, a ponto de ofuscar os demais poderes. Convém lembrar que vivemos em uma democracia e não em uma ditadura, que nosso governo possui, graças a Montesquieu, três poderes e que o legislativo exerce papel fundamental em uma instituição democrática como a nossa. Assim, rogo do pressuposto de que, por a câmara alta e baixa do Congresso estar, atualmente, repleta de representantes da base aliada do PT, o governo de Dilma não será solitário, mas apoiado pela maioria dos constituintes dos demais poderes. De mais a mais, dizer que Dilma é a sombra de Lula parece negligenciar o fato de que a candidata, como ministra, acompanhou de perto o governo lulista e que, no mínimo, apoiou tudo o que o atual presidente fez, seja quando alavancou o consumo interno, por meio da redução do IPI, e assegurou que o Brasil não fosse afetado fortemente pela crise imobiliária norte-americana, seja com o fato de nós termos nos tornado não mais devedores, mas credotes do FMI. Não nos esqueçamos também que Dilma tem uma trajetória singular, como também tiveram FHC e Lula, visto que foi guerrilheira, torturada durante a ditadura e lutadora a favor de um governo democrático.

Por último, a candidata petista tem meu voto pelo programa do PT no que tange o ensino universitário. É inegável que FHC, durante seu governo neoliberal, fez com que brotassem várias instituições privadas de ensino, muitas destas sem qualidade alguma, que podem ser caracterizadas como verdadeiros negócios oportunistas. Então, acho racional, como uma pessoa que almeja a vaga em uma universidade pública de qualidade, o apoio ao governo petista, que nos últimos anos investiu massivamente nas instituições públicas de ensino. Lula, por exemplo, teve papel fundamental na criação de universidades como a UFTM, UFABC, UFT, UNIFAL, unipampa, etc. Creio, portanto, que seria mais construtivo, como estudante, que o próximo governo continuasse a investir largamente em educação de qualidade, que aumentasse o número de instituições de ensino superior públicas, que gerasse maiores oportunidades de acesso à educação para aqueles com baixa renda e que fomentasse práticas como aumento salarial para professores da rede pública. Acredito, também, que proposta tucana nenhuma é capaz de satisfazer o que almejo e que um governo que prime pelo continuísmo do atual é, no mínimo, melhor que a manutenção das elites no poder.

domingo, 26 de setembro de 2010

Tiririca: pior do que está, fica



Acabo de ler que o promotor Antônio Ribeiro Lopes, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, pediu ontem (25/09) autorização para fazer um teste de leitura e escrita com o palhaço Tiririca. As suspeitas de que o candidato a deputado federal fosse iletrado, o que impediria sua candidatura, veio de uma recente reportagem publicada pela revista Época, a qual mostrava indícios de que Tiririca seria analfabeto. Escrevo hoje com o objetivo de ilustrar como a eleição de Francisco Everaldo Oliveira Silva, o Tiritica, pode agravar a situação política vigente. Teoricamente, nada impede a candidatura do humorista e cantor: é brasileiro, maior que 21 anos de idade, está alistado como eleitor, filiado a um partido político e em plena posse de seus direitos políticos. Logo, pode votar e ser votado da mesma maneira que qualquer professor doutor em política, visto que o regime democrático de nosso Estado assegura a igualdade dos direitos civis. A democracia assim, afirma a legitimidade da candidatura até mesmo de figuras exóticas como Mulher Pêra, Ronaldo Ésper, Sr. Marido da Mulher Maravilha, etc. Indivíduos dotados, comumente, de nenhum conhecimento político, que orbitam a esfera do plenário com o objetivo de corromper a máquina do Estado, extorquir, praticar nepotismo e garantir influência no meio social. O regime democrático, portanto, apresenta certa dicotomia: apesar de ser o melhor sistema governametal que conhecemos, é gerador também de entraves como a possível eleição de figurões que atraem o populacho, eleitores por inércia, desprovidos de qualquer consciência política e capazes de votar no primeiro palhaço que apareça. Somam-se aos riscos da democracia (não
para a democracia) o voto proporcional, que faz com que personagens como Tiririca tornem-se verdadeiros "puxadores de votos", o que pode proporcionar consequências nefastas ao Congresso Nacional, pois canditatos com grandes números de votos levam consigo membros de seu partido, que por vezes são verdadeiros crápulas: Valdemar da Costa Neto é um deles, que renunciou a seu mandato em 2005, por conta de envolvimentos com o Mensalão.De mais a mais, alguns vêem a votação em figuras excêntricas como voto de protesto, contudo, pergunto-me se essa forma de manifestação, reflexo de uma suposta insatisfação política, seja a maneira mais racional de lidar com a corrupção. O preço a ser pago por votar como forma de protesto em candidatos como Tiririca é alto demais, visto que pelo voto de legenda, "puxadores de votos" como ele podem levar consigo a escória das candidaturas. Em síntese, a candidatura de Tiririca não passa de piada pronta. Canditatos com propostas vazias e sem o menor conhecimento de política não devem ser levados a sério, devem sim ser vistos apenas como sombras, como pessoas que se forem eleitas, o serão por eleitores como eles, desprovidos de qualquer entendimento político. Situações como essas são reflexos da democracia, que apesar dos prós diversos que tem, ilustra também como pode gerar um eleitorado alienado, capaz de eleger palhaços.

domingo, 19 de setembro de 2010

Mais um estupro ético de nossos legisladores




Depois de uma semana sem internet, ou seja, quase morto, venho comentar um pouco a respeito do absurdo Projeto de Lei (PL) 478/07, mais conhecido como Estatuto do Nascituro. Basicamente, o irracional PL propõe a igualdade do direito à vida entre seres já desenvolvidos, leia-se as progenitoras dos embriões, e organismos que possuem ainda apenas potencial vital, ou seja, os conceptos, e indiretamente cria empecilhos não só de ordem ética e moral, mas também de caráter científico. O estatuto restringe o acesso de mulheres grávidas ao aborto terapêutico e a uma série de tratamentos de saúde, impede as pesquisas com células-tronco embrionárias e pode, mais absurdamente criminalizar gestantes por atos simples como a realização de trabalhos domésticos. Além disso, o Projeto de Lei, que felizmente ainda não passou pelo Congresso e pode ser vetado pelo presidente (ou mais provavelmente presidenta), desenvolve a surreal idéia de que um embrião fertilizado "in vitro", mantido em uma clínica de fertilização, merece proteção igual ou maior que uma pessoa já nascida. Nossos legisladores, mais uma vez, mostram-se desprovidos de qualquer capacidade cognitiva, de bom senso, lucidez e fazem-nos, por meio de um PL como esse, refletir a respeito da situação política vigente, repleta de propostas esdrúxulas e irracionais que podem de fato entrar em vigor em nosso país e agravar não só a situação das mulheres brasileiras, mas também dos profissionais da saúde.
Coloco aqui alguns excertos do Wordpress "contra o estatuto do nascituro (http://contraoestatutodonascituro.wordpress.com/)" e ao fim do post o link para a petição eletrônica contra o projeto.

Proibição do aborto terapêutico e restrição da gestante a tratamentos de saúde contra doenças como o câncer: O Art. 4º do PL diz que o nascituro deve ter assegurado, com ”absoluta prioridade”, entre outras coisas, seu direito à vida, à saúde e ao desenvolvimento. ”Absoluta prioridade” significa prioridade sobre qualquer direito de qualquer pessoa, inclusive os da mulher que o carrega. Isso significa que a gravidez não pode ser interrompida mesmo que ameace a saúde da gestante, pois a ”vida” do feto tem prioridade sobre a saúde da mulher. Como o Art. 5º do projeto determina que qualquer ”violência” contra o nascituro será punida na forma da lei, um tratamento de saúde que ameace a continuidade da gravidez pode ser considerado ilegal, com a consequente punição dos profissionais responsáveis por ele e da paciente. Quando os abortos terapêuticos foram proibidos na Nicarágua, em 2006, os profissionais de saúde passaram a trabalhar com tanto medo de persecução penal e perda das licenças profissionais, que a consequência foi que gestantes tornaram-se incapazes de ter acesso a tratamentos como quimioterapia, radioterapia, cirurgia cardíaca e até mesmo analgésicos, pois tudo isso pode afetar o embrião ou feto. O medo de participar em um processo de abortamento (espontâneo ou provocado), mesmo que seja para interrompê-lo, é tão grande que mulheres com hemorragia simplesmente não recebem atendimento médico. Segundo a organização internacional Human Rights Watch, só no primeiro ano de legislação proibitiva, 82 mulheres morreram. Na página ”Como a proteção ao nascituro está matando mulheres na Nicarágua” você pode conhecer casos como o da mulher nicaraguense com câncer no cérebro que passou um mês jogada em um hospital sem receber quimioterapia ou alívio para sua dor. No link á direita desta página, você pode ler o relatório Over Her Dead Bodies (Por Cima de Seus Cadáveres), elaborado pela Human Rights Watch sobre a situação naquele país.

Criminalização de mulheres grávidas e do aborto espontâneo: Em países com legislações que punem atos contra o nascituro, como os EUA, mulheres grávidas são tratadas como criminosas em potencial. Em alguns Estados, elas podem ser investigadas e processadas se consideradas responsáveis por atos que ameacem o feto. Em outros, podem ser internadas contra sua vontade em hospitais, mesmo que a existência de filhos pequenos ou a necessidade de trabalhar tornem a estadia extremamente desaconselhável. Em alguns lugares, podem ser condenadas por homicídio se consideradas responsáveis pelo nascimento de um bebê natimorto. Na página ”Como a proteção ao nascituro gera violações aos direitos de mulheres grávidas’, você pode ler casos como os da mulher grávida investigada pela polícia por ter caído nas escadas, o da mulher internada à força em um hospital após recusar-se a passar 03 meses longe de seus filhos, e perder seu emprego) e o da jovem de 15 anos acusada de homicídio quando deu à luz um natimorto.

Essa lei criminalizaria principalmente mulheres pobres por não ter acesso a informação e a uma rede de apoio adequada. Talvez fazer trabalhos domésticos pesados, carregar crianças no colo, andar de moto ou de bicicleta, apenas para citar alguns exemplos, não sejam os atos mais recomendáveis para uma mulher com uma gravidez de risco. Mas muitas vezes não existe alternativa para a mulher que é pobre, mãe solteira, não pode deixar de trabalhar e não tem ninguém que possa cuidar de sua familia, ou que possa fazê-lo permanentemente. Embora algumas gestações exijam que a mulher faça pouco ou nenhum esforço, o repouso absoluto não é uma opção para a grande maioria das mulheres brasileiras. E nenhuma mulher deveria ser punida por tentar prover sua subsistência e a de sua família.

Mesmo quando o ato é claramente prejudicial, como o fumo ou o uso de drogas, a criminalização do comportamento da mulher durante a gravidez é desaconselhada por todos os organismos de saúde que já conduziram estudos sobre o tema. Nos EUA, onde gestantes podem ser presas e perder a guarda dos filhos por uso de drogas durante a gravidez, algumas cidades chegam ao cúmulo de conduzir testes toxicológicos em todas as pacientes que chegam ao hospital para dar à luz ou buscando cuidados pré-natais. Se é descoberta a presença de drogas no organismo, a polícia é chamada e a mulher é imediatamente presa (algumas ainda sangrando devido a complicações do parto). A Associação Americana de Saúde Pública, Associação Médica Americana, e o Conselho Nacional de Uso de Drogas e Álcool são contra a persecução criminal de gestantes por uso de drogas, já que numerosos estudos comprovam que tal política evita que as mulheres procurem cuidados pré-natais e tratamento contra a dependência, causando muito mais mal a sua saúde e à do feto.

Existe ainda o problema de determinar exatamente o que foi responsável pela ”violação ao direito do embrião”. Há que se perguntar se é sensato submeter uma mulher que acabou de passar pela experiência traumatizante de um aborto espontâneo (evento que pode ocorrer em cerca de 25% das gestações) a uma investigação para determinar sua culpa no evento, e quem sabe puni-la por isso. É um verdadeiro atentado contra sua saúde mental, considerando que a maioria das mulheres experimenta sensação de culpa pelo abortamento, independentemente de sua responsabilidade nele, e sintomas de depressão e luto que, sem tratamento, podem inclusive agravar-se para um quadro de depressão clínica. Apontar o dedo para esta mulher em busca de sua parcela de culpa no evento é violar o direito constitucional de não sofrer tratamento cruel, desumano ou degradante.

Proibição e criminalização de pesquisas com células-tronco: a pesquisa com células-tronco embrionárias, realizada com embriões fertlizados ”in vitro”, é de enorme importância na busca de cura para doenças hoje consideradas incuráveis, como a distrofia muscular progressiva (doença que gera degeneração dos músculos, culminando em comprometimento dos músculos cardíacos e respiratórios), diabetes, doenças neuromusculares, renais, cardíacas ou hepáticas. Ela é realizada com embriões que seriam descartados por clínicas de fertilização in vitro. O Supremo Tribunal Federal decidiu em 2008 que esse tipo de pesquisa não viola o ”direito à vida” do embrião, pois este direito é inexistente, e integra o direito fundamental à saúde. Já que o Estatuto do Nascituro pretende punir qualquer violação ao ”direito à vida” de embriões, inclusive os fertilizados in vitro, o Projeto passa por cima da interpretação do STF, guardião e intérprete maior da Constituição, viola o direito inviolável à saúde, e pretende reinstaurar a vergonhosa situação em que embriões que poderiam salvar vidas eram descartados no lixo.

Petição: http://womensrights.change.org/petitions/view/rejeite_o_estatuto_do_nascituro_proteja_a_saude_das_mulheres_e_a_terapia_com_celulas-tronco_2

domingo, 5 de setembro de 2010

Desvendando "O Segredo"


Anteontem, dia 3 de setembro, encontrei na Biblioteca Pública Municipal Bernardo Guimarães um anúncio a respeito de uma palestra que ocorrerá na sexta-feira próxima, dia 10 de setembro, a respeito da famigerada obra literária e documentária "O Segredo". Escrevo por estar compelido a criticar algumas afirmações pseudocientíficas que o ducumentário faz e que conquista um grande contingente populacional. Independentemente de ser um livro de auto-ajuda ou não, a compilação de Rhonda Byrne faz afirmações pouco verificáveis e utiliza-se da física quântica como embasamento teórico para sua "lei da atração". Segunda essa lei, que não é originalmente sua diga-se de passagem (não só o apóstolo São Marcos tinha a sua versão do "peça-acredite-receba", como também possuia Buda uma idéia similar que dizia "tudo o que somos é o resultado de nossos pensamentos"), o universo seria influenciado pelos pensamentos humanos e agiria de acordo com nossos desejos. Assim, o documentário postula que para conseguir-se algo é necessário enviarmos sinais mentais para o cosmos para que ele os interprete e os converta em possibilidades terrenas, como por exemplo, a obtenção daquela tão sonhada bicicleta na infância.
Primeiramente, gostaria de deixar uma questão clara: o que combato aqui não são a auto-estima pessoal, o otimismo e a força de vontade que as pessoas têm e que as ajuda de fato a superar situações difíceis como doenças, problemas pessoais e dificuldades financeiras. O que critico nesse pequeno artigo é a crença em um universo preocupado e ligado com a raça humana, capaz de realizar seus menores caprichos como demandas amorosas e monetárias. Como bem observou o notável físico estado-unidense Richard Feyman "posso dizer seguramente que ninguém entende a física quântica" e "se você acha que entendeu alguma coisa de mecânica quântica, é porque você não entendeu nada". Portanto, por a física moderna ser um campo tão desconhecido e que beira por vezes o bizarro, mascarar a "lei da atração" com viés quântico é no mínimo absurdo, visto que afirmar tão contudentemente, como fazem os pseudocientistas no documentário, que a lei possui evidências científicas é ignorar os fatos e a complexidade do mundo quântico. Então, existe uma enorme diferença entre perseguir aquele bônus de final de ano e acreditar que sua conta bancária vai aumenta , caso você escreva zeros com uma caneta à direita do seu saldo, como afirma o filme "O Segredo". Seria sensato também mostrar o quanto o documentário é oportunista e assemelha-se àqueles infomerciais, programas com aparência informacional mas com caráter comercial embutido, como aqueles clássicos da Polishop. E isso tudo é muito preocupante não só por manter a população ignorante da verdade mas também por ser uma oportunidade para charlatões de plantão extorquirem o dinheiro das pessoas. Imagine só se a moda de recicliar velhos esoterismos pega.. teríamos daqui a pouco homeopatas, astrólogos, quiromantes e radiestesistas com um segredinho para vender por R$39,90.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Sobre discos-voadores


Foi publicada recentemente uma nova portaria do Comando da Aeronáutica sobre o "registro e trâmite de assuntos relacionados a 'objetos voadores não-identificados'"
. Assim, pela exautação que o assunto provocou na comunidade de ufólogos, que não é pequena diga-se de passagem, convém um post a respeito de discos-voadores e da existência de vida inteligente em outros planetas.

Primeiramente, é conveniente separar os dois assuntos: enquanto o primeiro possui entusiastas diversos, oferece atrativos a população e geralmente é marcado por pseudociência, o segundo possui estudo científico sério, como a astrobiologia e o projeto SETI. Essa sigla em inglês significa "Search for Extra-Terrestrial Intelligence" e objetiva, com a ajuda de radiotelescópios poderosos, encontrar vida inteligente em outros planetas. Infelizmente, durante esses 40 anos desde que o projeto está em voga, tudo o que tivemos foi o absoluto silêncio, o que claro não significa a ausência de organismos complexos fora de nosso sistema solar. O universo por si só é muito grande, é formado por mais de 80 bilhões de galáxias, nossa Via Láctea é composta por aproximadamente 400 bilhões de estrelas e possui 100 mil anos luz de comprimento, o que torna de fato egoísta e simplista o pensamento de não haver vida inteligente fora de nosso planeta.


Agora, quanto a existência de discos-voadores que nos visitam frequentemente e abduções alienígenas é necessário cetismo, visto que afirmações fantásticas de fato requerem evidências fantásticas, e até o momento presente não houve uma só evidência sobre ovnis ou sequestros por extra-terrestres que parou em pé. Os que afirmam terem sido abduzidos, dizem que têm uma certa lembrança do fato, até narram vividamente o que aconteceu, citam os objetos cirúrgicos utilizados, relatam o desejo nefasto que os alienígenas têm por genitálias e cópula com humanos.


Contudo, com afirmações como essas, esses seres de outro planeta devem ser bem atrasados. Primeiro por fazerem um serviço mal feito e não apagarem por completo a memória terráquea, o que de fato seria benéfico para manter-se o anonimato. Segundo por os instrumentos descritos pelas vítimas serem muito parecidos com o de um cirurgião humano, o que implicaria em uma tecnologia rudimentar para os seres que teriam vindo de uma estrela tão longínqua. E por último esse desejo de se reproduzir com humanos por meio do sexo, o que é retrógrado demais em comparação até com nossa tecnologia genética, com a qual é possível gerar prole sem haver sequer contato sexual. Se esses alienígenas realmente existissem e fossem mesmo evoluídos, decodificariam o genoma do homem e sintetizariam seres com características infinitas para suas experiências, o que seria em termos científicos de fato mais sagaz que copular com uma fêmea humana. Por fim, convém invocar o paradoxo proposto pelo físico italiano Enrico Fermi a respeito das visitas de seres de outro planeta: "se alienígenas extraterrestres são comuns, por que não são óbvios? Onde estão eles?".

Entusiastas e ufólogos até têm uma resposta para essa pergunta, mas uma que não convém o prolongamento do post, uma até comum nos dias atuais que funciona como resposta para questões diversas: a de que existem provas, mas que o Governo está guardando e tudo é uma grande teoria da conspiração.

domingo, 22 de agosto de 2010

Auschwitz anímico


Conforme comentado a alguns, hoje escrevo sobre o aborto. Assunto delicado, que envolve tanto implicações de ordem ética e moral quanto religiosas, o aborto conclama a população esclarecida a debater calorosamente sobre o assunto. Para restringir-me a um campo e não delongar muito o texto, disserto a respeito das incoerências religiosas defendidas por alguns anti-abortistas. O primeiro argumento, amplamente defendido pela Igreja, é o de que durante a concepção, o embrião recebe uma alma e, portanto, uma individualidade espiritual distinta de qualquer outro ser vivo.

Inicialmente, convém ressaltar alguns pontos aparentemente desconhecidos ou ignorados por esses religiosos, como o fato de estatisticamente de 2/3 a 3/4 dos zigotos não se nidarem efetivamente no útero materno. Assim, partindo do pressuposto de que as almas já estivessem presentes nos embriões, haveria um verdadeiro "holocausto anímico" e um desperdício do esforço divino para instaurá-las em seus receptáculos. Religiões distintas da católica, que adotam a metempsicose (transmigração das almas) são mais felizes e poderiam postular que o indivíduo, apesar de morto, teria outra chance em uma vida posterior. Mesmo que relevemos esse ponto e admitamos que 100% dos óvulos já fencudados fixem-se no endométrio e não haja aborto espontâneo, o conceito de alma e seu surgimento durante a vida não resiste por si só. Uma pergunta que faço a mim mesmo é a respeito do tempo que esses espíritos levam para efetivamente entrarem
em seus receptáculos, se levam mais tempo as meninas (48º dia), como afirmou São Tomás de Aquino, ou os meninos (40ºdia).

Esse tipo de argumentação, supersticiosa e sem evidência alguma, torna prosaico demais o desenvolvimento embrionário humano e gera problemas sociais graves. O método abortivo, apesar de amplamente criticado por alguns, se visto sob uma ótica pragmática e utilitarista torna-se louvável. A razão disso é justificada não só por gravidezes indesejadas gerar desagração familiar, comprometimento do futuro individual, mas também por, caso a prática abortiva seja efetivamente penalizada, haver o sobrecarregamento da máquina estatal. Se supormos que todas as pessoas que praticassem o aborto fossem devidamente processadas e presas, seria necessária , segundo Mário Francisco Giani Monteiro e Leila Adesse, a construção de 5,5 presídios por dia, ou seja, um enorme gasto aos cofres públicos e um mau-investimento, considerando-se o número de problemas pelos quais passa nosso país. Soma-se a isso o número de abortos clandestinos, que são de fato uma preocupação à saúde pública e a quantidade de recursos financeiros utilizados durante o tratamento de mulheres que passaram por um processo abortivo invasivo, desprovido de assepcia dos instrumentos cirúrgicos e amplamente perigoso. Portanto, seria sensato uma abordagem lógica a respeito do aborto, desprovida de qualquer caráter religioso, mais pragmática e utilitarista, para que possamos de fato aumentar a qualidade de vida populacional e não sobrecarregar a máquina do Estado.

domingo, 15 de agosto de 2010

Astrologia, uma venda aos olhos


Existem duas maneiras de analisar-se as estrelas: como elas realmente são e como nós gostaríamos que elas fossem. A primeira forma é feita através do escrutínio imparcial da ciência, marcada pelo empirismo e dotada de ferramentas criadas para entender-se o funcionamento do cosmos. Já a segunda maneira é caracterizada por uma ótica supersticiosa, desporovida de qualquer experimentalismo e que postula um universo conectado a nós, capaz de atuar diretamente sobre nosso futuro amoroso, social e financeiro. Mesmo após 300 anos desde que as últimas fundações intelectuais baniram o estudo astrológico, é comum encontrar-se nos jornais, revistas e outras ferramentas da mídia impressa horóscopos e outras citações de astrologia. O homem tem a necessiadade de confortar-se com a idéia de um universo não-alheio a sua existência, de que tudo está conectado, por isso cria significados cósmicos para sua vida. De fato há uma conexão entre os habitantes da Terra e o restante do universo, mas nada simplista como postula a astrologia pré-copernicana, nada enfadonho e deselegante como propõem os astrólogos. A ciência pelo contrário explica como o sol exerce papel fundamental em nossa existência, seja fornecendo energia aos vegetais e indiretamente a nós, ou proporcionando um clima oportuno à vida terrestre. Usar a astrologia para explicar o funcionamento do universo, como bem comparou Richard Dawkins, é como usar Beethoven em jingles comerciais, uma afronta estética. Além da deselegância das previsões astrológicas, casos típicos como o de gêmeos nascidos no mesmo momento (ou com minutos de diferença) provam a ineficácia da pseudo-ciência. Os dois bêbês nesse caso, teriam nascido quando um mesmo astro ou constelação estava em ascendência, o que implica em um traçado de vida semelhante. Contudo, é bem pouco provável que esses dois indivíduos morrerão da mesma forma, visto que um deles poderá morrer em um acidente rodoviário enquanto o outro poderá morrer de alguma doença geriátrica, por exemplo. Convém também dizer o que a princípio parece inofensivo, é na realidade preocupante, visto que em pleno século XXI é ainda comum nas livrarias os livros de astrologia serem vendidos mais que os de astronomia. Após termos percorridos um caminho histórico tortuoso, marcado por inquisições, misticismo e religiosidade, ainda defrontamo-nos com charlatanismos pseudo-científicos, claramente oportunistas e que não resistem a uma análise lúcida dos fatos.

domingo, 8 de agosto de 2010

"O universo não foi feito à medida do ser humano, mas tampouco lhe é adverso: é-lhe indiferente."


Acabo de assistir ao melhor projeto de divulgação científica de que tenho conhecimento. A série "Cosmos" de Carl Sagan é antes de tudo altamente apaixonante. O físico, através do documentário de 13 episódios, procura mostrar como o universo é poético, elegante e de uma forma brilhante narra os maiores fatos científicos da história, como a evolução dos organismos, a descoberta e importância do DNA. Creio que películas como essa deviam ser obrigatórias nas escolas, por além de despertar nos alunos a curiosidade pelo cosmos, conclama-os a ver como a ciência e as descobertas humanas são belas. Carl Sagan foi sem dúvida nenhuma um dos maiores gênios que caminharam sobre a Terra até hoje e promoveu um trabalho fantástico durante essa sua curta passagem de vida. Infelizmente, nos dias de hoje o estudo científico é visto pela maioria das pessoas como algo enfadonho, marcado pelo tecnicismo e pela memorização dos fatos. Os que pensam assim, contudo, muitas vezes não têm culpa, visto que foram educados majoritariamente em um sistema de ensino que privilegia o aspecto teórico e rejeita o experimentalismo, a associação dos fatos com o cotidiano. O sistema de ensino atual, principalmente o brasileiro, carece de pessoas como Sagan e estão repletos de professores maquinistas, que aprenderam ciência através da memorização e que são, na maioria das vezes, completamente desprovidos do fascinio científico. Uma mudança nas escolas brasileiras e mundiais deve ser feita para que possamos formar profissionais mais capazes, aptos a contribuírem substancialmente com os adventos e descobertas humanas. É fato que o Brasil possui bons cientistas e divulgadores científicos como Marcelo Gleiser, mas ainda o número é ainda muito reduzido em comparação com o número total de brasileiros. Garanto que com um número maior de pessoas providas de maior paixão pelo mundo físico, natural e não irgnorantes da beleza do universo, alguns problemas como o descaso e degradação do planeta Terra seriam atenuados.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Ateísmo e maldade


Hoje comento sobre a guerra que o apresentador da TV Bandeirantes, José Luís Datena, declarou aos ateus brasileiros. O caso é mais ou menos o seguinte: Datena,no último dia 27, com o objetivo de comentar a respeito de crimes hediondos, criou uma enquete na qual os telespectadores respoderiam se acreditavam ou não em Deus.
Eis que o âncora, ao ter suas expectativas superadas pelo número de "não" da enquete, resolveu intervir a favor do Todo-Poderoso. Alguns trechos dos comentários do apresentador:
"
-Como? Nós temos mais de mil ateus? Aposto que muitos desses estão ligando da cadeia."
"-Ateus são pessoas sem limites, por isso matam, cometem essas atrocidades. Pois elas acham que são seu próprio Deus."
"-É só perguntar para esses bandidos que cometem essas barbaridades pra ver que eles não acreditam em Deus."
Trechos como esses mostram ignorância quanto a história humana. Como é praxe, sabe-se que a Igreja Católica durante a Idade Média foi um verdadeiro açougue. Nos tempos da Inquisição, o fanatismo religioso era tão fervoso que foram mortas mais pessoas do que todo o Holocausto. A Igreja matou mais que Hitler, Mao Tsé-Tung e Stalin. Assim, argumentos como o do apresentador mostram-se completamente desprovidos de qualquer embasamento lógico e histórico. Soma-se a isso, não só o passado coturbado do catolicismo, mas também o fanatismo religioso recente, marcado principalmente pela Jihad. Extremistas islâmicos, com o objetivo de propagar sua fé suicidam-se com bombas, buscam um paraíso repleto de virgens, e levam consigo várias pessoas alheias ao dogmatismo islâmico. Uma outra ilustração recente da perniciosidade religiosa, que rebate os argumentos de Datena, são os ataques constantes que algumas clínicas de clonagem terapéutica têm recebido por parte de fanáticos religiosos "pro-vida", contrários as pesquisas com células-tronco embrionárias.
Convém também mostrar alguns dados estatísticos para ilustrar o preconceito do âncora. Como prognosticou Datena, caso o ateísmo seja mesmo sinônimo de violência, as prisões deveriam estar repletas de descrentes em Deus. Contudo, estatísticas reveladas por uma funcionária do Birô Federal de Prisões dos EUA de 1997 mostraram que a proporção de cristãos encarceirados é de 80%, mesmo valor da população geral. Muçulmanos, que correspondem a algo entre 1% e 3% dos norte-americanos, eram 7,2% dos presidiários. Os ateus, nesse caso, que remontam 0,4% da população estadunidense, possuem apenas 0,2% de apenados. Datena também parece ter pouco, ou nenhum conhecimento sobre Evolução, visto que a moral, sob visão darwinista, foi fundamental para a sobrevida do Homo sapiens, independentemente da religião, que aliás surgiu dezenas de milhares de anos depois. Para o homem primitivo foi fundamental o altruísmo recíproco, caso contrário, as chances de estarmos aqui seriam drasticamente reduzidas pelo ambiente hostil, pelos perigos que eram proporcionados pela savana africana há aproximadamente 50000 anos atrás.
Seria sensato pedir aos ateus e até aos agnósticos que manifestem-se contra atitudes anti-democráticas e preconceituosas como as do apresentador Datena. O programa "Brasil Urgente", apesar de não ser de meu feitio, tem um alcance nacional muito grande e é altamente manipulativo e tendencioso. Sei que alguns membros da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea) já pensam em processar o apresentador, o que é louvável, mas para aqueles que não possuem tamanha predisposição jurídica, que escrevam algum texto e publiquem em alguma rede social.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

"I wanna do bad things with you"


True Blood é de fato, junto com as obras de Annie Rice e o filme sueco "Let the Right one In", uma das poucas boas adaptações da mitologia vampírica criada por Bram Stoker. A série não deixa a desejar em vários aspectos: possui personagens complexos com personalidades carismáticas e pouco típicas, como Lafayette e seu jeito peculiar de conversar, Eric com seu caráter completamente dual e imprevisível e Bill, um vampiro mais humano que vários homens. Além disso, conta com uma trilha sonora fantástica, com uma abertura ao som de "Bad Things" de Jace Everett, bem a cara da série, que mostra e cria um climão de superstições antigas, religiosidade e fanatismo. True Blood é antes de tudo uma metáfora de extremos com um estilo "gótico sulista" de Lousiana, onde os personagens, com seus sotaques tornam-se marcantes e contribuem para aclimatar a série.Ademais, o programa é também bem fiel ao mito do vampiro, que ao contrário das adaptações modernas como as de Stephenie Meyer, mostra como a sociedade vampírica é formada, com seus reis, rainhas e xerifes; além de também retratar a subordinação e o respeito que os vampiros têm pelos companheiros mais fortes, de maior ascenção na linhagem de sangue. Ao contrário dos chupadores de sangue de Crepúsculo, os vampiros de True Blood provavelmente sentiriam-se ofendidos por poderem caminhar a luz do dia, brilharem como uma lâmpada incandecente, ou negarem sua natureza predatória, como é comum para os chupa-sangue de Meyer.
A série é um prato cheio para aqueles que apreciam vampiros e que buscam uma trama criativa, fiel e envolvente, capaz de fazer qualquer fã esperar ansiosamente por cada capítulo semanal. Recomedadíssimo ;)

quarta-feira, 14 de julho de 2010

"I'm in your box messing with your paradox"


Venho dizer como surgiu, a partir de uma suposição bizarra, a expressão que deu nome ao blog. O "Gato de Schrodinger" foi uma metáfora criada pelo físico austríaco Erwin Schrodinger para ilustrar como a Física Quântíca é por vezes estranha e beira o bizonho em diversas situações. A comparação metafórica foi feita pelo físico para mostrar como a Interpretação de Copenhague (http://pt.wikipedia.org/wiki/Interpreta%C3%A7%C3%A3o_de_Copenhague), se levada ao dia-a-dia, pode mostrar-se paradoxal. O experimento ilustrativo proposto por Schrodinger consistia em mostrar como, de acordo com a mecânica quântica, um gato poderia estar vivo e morto ao mesmo tempo. A experiência consistia em relacionar, através de um "mecanismo diabólico", os efeitos quânticos a um corpo de grande escala, como um gato. Assim, por meio das própias palavras de Schrodinger:
"Qualquer um pode mesmo montar casos bem ridículos. Um gato é preso em uma câmara de aço, enquanto com o dispositivo seguinte (o qual deve estar seguro contra interferência direta do gato): em um contador de Geiger tem uma pequena quantidade de substância radioativa, tão pequena, que talvez durante o período de uma hora, um dos átomos decaia, mas também, com a mesma probabilidade, talvez nenhum; se isso acontecer, o tubo do contador descarrega e através de um relé libera um martelo que quebra um pequeno frasco de ácido cianídrico. Se algum deles tiver saído do seu sistema natural por uma hora, alguém pode concluir que o gato permanece vivo enquanto o átomo não tiver decaído. A função-psi do sistema poderia ser expresso por ter dentro dele o gato morto-vivo (com o perdão da palavra) misturada ou dividido em partes iguais. É típico desses casos que uma indeterminação originalmente restrita ao domínio atômico tenha sido transformada em uma indeterminação macroscópica, o qual pode então ser resolvido por observação direta. Isso nos previne de aceitar tão inocentemente como válido um "modelo confuso" para representar a realidade. Por ele mesmo ele não explicaria qualquer coisa imprecisa ou contraditória. Existe uma diferença entre uma fotografia tremida ou desfocada e uma foto de nuvens e neblina."

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Boa Morte



Acabei de assistir "You Don't Know Jack", mais uma produção incrível da HBO, que além de trazer a interpretação finíssima de Al Pacino como Jack Kevorkian , é recheada de uma discussão pesada sobre eutanásia. O termo, que em grego significa "boa morte" é visto por alguns como uma forma de homicidio e por outros como suicídio assistido.

Assim, é conveniente primeiramente distinguir os termos. Se vista sob a ótica do juramento de Hipócrates, a eutanásia pode de fato ser interpretada como homicídio, visto que segundo o preceito hipocrático o médico não pode ser juiz da vida ou da morte de alguém. Contudo, convém apontar que o doente, que por vezes sofre dores excruciantes, tem o direito de arbitrar sobre o quanto deseja viver. Assim, apesar de ir contra o consagrado juramento, a eutanásia é antes de tudo um direito a autodeterminação. Ademais, moléstias diversas são crônicas, o que torna constante as dores do paciente, que apesar de dispor das avançadas medidas paliativas, não tem suas debilidades físicas suprimidas. No Brasil, esse evento é ainda mais trágico por medicamentos como a morfina, analgésico pesado e fundamental no combate de dores agudas, serem utilizados parcamente, o que reflete em pacientes com mais sofrimentos.


Quanto a comparação de eutanásia com suicídio assistido, uma distinção deve ser feita. Enquanto que no primeiro um terceiro executa o processo, o segundo ato é provocado pelo próprio doente, mesmo que para isso receba auxilio de outras pessoas.

É estranho como o homem, ser de natureza altruista é paradoxal às vezes. O processo da eutanásia é legalizado para qualquer animal que não seja o Homo sapiens. Quando cães e gatos estão agonizando por algum caso de câncer, o ser humano sente-se no dever de sacrificá-los para por um fim a seus sofrimentos. Contudo, quando trata-se de doentes em estados terminais na área de oncologia, a conversa é um pouco diferente. É estranho como recorrem a preceitos morais quando a vida humana está em jogo, mesmo que essa atividade vital não seja desejada pelo dono da própria vida. Argumentos de cunho religioso são praxe, como os que proclamam a vida como um direito divino e que cabe somente a Deus o direito de tirá-la. Deus, nesse caso, está talvez sendo um pouco desatento quanto ao sofrimento de seus súditos por não deixar o usofruto do livre-arbítrio comumente conclamado.
A melhor resposta que encontro para esse caso é a que o próprio "dr. morte" utilizou para repelir a alegação de um fanático que o abordou dizendo que o direito a morte é algo que cabe somente a Deus decidir. O médico nesse caso diz "bem, Deus para mim é Bach e diferentemente do seu Deus, o meu existiu". Seria sagaz uma abordagem desprovida de qualquer cunho religioso a respeito da eutanásia, pois esse procedimento é antes de tudo uma forma de beneficiar pacientes que perecem por dores inimagináveis por nós, acostumados a pequenas cefaléias e dores no estômago.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Uma análise lúcida a respeito da transgenia




A transgenia e os alimentos transgênicos têm estado sob o foco midiático nos últimos anos. Não só por abordar questões políticas, como as práticas agressivas de empresas multinacionais e os efeitos da globalização, mas também pelas aplicações ambientais que as plantas geneticamente modificadas podem trazer. Seja lá como for, uma abordagem escrupulosa deve-se basear primeiramente em questões científicas, para depois ser discutida sob o âmbito político-econômico.

Um dos argumentos utilizados por ativistas contra os transgênicos é a alegação de que não são naturais, que foram criados geneticamente pelo homem e que exemplares naturais não existiriam. Há, contudo, uma deficiência na argumentação usada por esses manifestantes, visto que a grande maioria das variantes alimentícias consumidas pelo ser humano moderno sofreram seleção antrópica em algum estágio de sua vida. Assim, grãos como o milho conhecido hoje diferem em demasia de seu ancestral de grãos miúdos e secos, que mal serviriam de alimento para uma família de homens primitivos. A alegação, portanto, de que os transgênicos não são naturais é inocente por desconsiderar o fato de o Homo sapiens já ter modificado geneticamente seu alimento, via seleção artificial, desde o advento da agricultura no período Neolítico.

Outra tese pouco justificada é a de que os transgênicos provocarão um desastre ambiental com o surgimento de "superervas daninhas". A preocupação, nesse caso, é a de que as pragas assimilem parte do genoma das plantas que parasitam e tornem-se mais resistentes aos defensívos agrícolas. Essa justificativa, porém, é também frágil por desconsiderar a seleção natural e todo processo evolucionista, que invariavelmente cria orgaismos resistentes, independentemente da presença ou ausência de plantas transgênicas. Com a aplicação de uma pesticida, por exemplo, o agricultor seleciona as variantes da praga que são resistentes àquele agrotóxico e garante a formação de uma linhagem de organismos mais bem adaptados à lavoura, o que economicamente não é bem-vindo. Ademais, a despeito de gerar também pragas resistentes, os transgênicos evitariam a aplicação de agentes poluentes como o DDT ou Defensivos Agrícolas Organofosforados nas lavouras.


Em suma, para obter-se uma abordagem lúcida a respeito dos transgênicos, uma análise científica, desprovida de influências político-econômicas deve ser feita. Assim, argumentos como os utilizados por manifestantes diversos devem ser analisados sob a óptica da ciência e distante de opiniões tendenciosas, marcadas por seu cunho pseudo-científico.